Fiel da Balança 2020

À medida que os anos do curso de Direito vão avançando, começamos a apercebermo- nos que nem tudo é tão poético como imaginávamos quando entramos na Faculdade. Os sonhos de ajudar a mudar o mundo e defender direitos humanos (ou dos animais, quem sabe) começam a ser substituídos por análises de acórdãos, definições das linhas de parentesco entre dois indivíduos ou pressupostos processuais – sem desprimor para os aficionados das respetivas áreas. Assim, com o passar do tempo, a visão idealista com que entramos na Faculdade vai sendo relegada para segundo plano. No entanto, não devemos crucificar o estudo dos acórdãos, das linhas de parentesco, dos pressupostos e de outras matérias menos “didáticas”. Logicamente que o estudo destas matérias é vital, porque o bom funcionamento do nosso sistema jurídico depende de juristas que as conheçam. Mas o bom funcionamento de um sistema que é deficiente revela as falhas dos seus intervenientes. E todos estes intervenientes terão um ponto em comum – foram estudantes de Direito. Enquanto estudantes de Direito, temos o dever de fazer uma análise crítica do ensino do mesmo. Se, enquanto espectadores da primeira fila, não o fizermos, ninguém o fará por nós. Assim, pretendo analisar dois problemas que considero relevantes no ensino do Direito. Antes, faço um pequeno disclaimer : quando me refiro a ensino do Direito, não me refiro necessariamente a aulas práticas e teóricas, mas ao plano abrangente da Universidade. O primeiro problema do ensino do Direito está, na minha opinião, em fazer do futuro jurista um autêntico robot, programado para colocar de parte as suas motivações em prol de uma visão mecanizada das leis. Esta visão mecanizada surge como uma grande vantagem no estudo das leis – nada melhor que o aluno que, de forma automatizada e isenta de qualquer pensamento crítico, vai decorar as posições doutrinárias do professor regente de forma exímia. Apesar das óbvias vantagens em nos tornarmos robots juristas sem opiniões próprias e isentos de qualquer espírito reivindicativo, penso que não será esta a ambição da maior parte dos meus colegas. O segundo problema prende-se com o culto à individualidade que se vive numa Faculdade de Direito, popularmente conhecido nos corredores como “o colega que não empresta os apontamentos”. O problema é óbvio e todos o reconhecemos, mas não deixo de ver uma grande contradição entre ser estudante de Direito e ser egoísta.

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