Quadrante 15

Paragem Jacarandá: Quem Tem Medo de Ser Artista? por Noa Brighenti

Ao longo da minha estadia nas Gargantas Soltas tenho escrito muito sobre educação: tanto sobre os cursos científico-humanísticos do ensino secundário como sobre o ensino superior — falei deles por serem aquilo que conheço e por nunca me ter parecido haver na prática, uma outra via, por mais que a pudesse querer. Sem me aperceber, estabeleci uma hierarquia escolar e com ela fui eliminando opções melhores que aquela que acabei por escolher para mim — ou, pelo menos, diferentes. Foi ao entrar nas Jacarandá Sessions que dei de caras com quem quebrou estas barreiras e teve a coragem de escolher um caminho seu em vez de escolher, para si, o caminho de outros. Hoje, venho falar-vos desta outra perspetiva: do Coletivo Artístico Jacarandá e de dois dos seus sete membros, António Pinto e Xavier Lousada, para quem os cursos artísticos especializados foram a única via. Assim, vamos ao que interessa. Este encontro ocorreu numa segunda feira à noite no Bus - Paragem Cultural, onde o Coletivo tem a sua base, e onde nos sentámos a conversar, rodeados de instrumentos que esperavam a Jacarandá Session do dia seguinte.

Como a maçã cortada em fatias (não sei se se diz fatia ou gomos — para a Sofia são gomos, mas não me faz muito sentido): pego na maçã e na faca e corto a maçã com a faca e a maçã deita sumo e ponho um lenço por baixo e as minhas amigas gozam comigo porque deixo tudo sujo e depois roubam as fatias que cortei e dizem que quem corta maçãs são os miúdos pequenos e eu não as oiço — maçã fatiada sabe melhor. Se se diz maçã fatiada é porque são fatias e não gomos. A Sofia não ficou convencida com este argumento, foi procurar à internet. A Marta chegou e disse “gomos são para as tangerinas e laranjas”. A Sofia perdeu. Chega Maio e ninguém quer estudar e podemos passar horas a discutir como se devem ou não dizer as palavras, mesmo que os exames estejam à porta; afinal chegou Maio e com ele chegou o sol e podemos fingir que não estamos fechadas no mesmo edifício horas a fio em busca de questões doutrinárias escritas por professores de peito cheio. Este ano, com Maio, chegaram também as Jacarandá Sessions no Bus - Paragem Cultural e, com elas, Maio continuou a existir durante o resto do ano: todas as terças-feiras, de duas em duas semanas, numa cave sem luz natural. Mas está lá, eu juro.

Quadrante, 2023

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