Quadrante 14
Não acontece isso hoje? O Mundo Ar- tístico em Portugal sucede em Círculo Fecha- do, ou no Lobby da Arte. Quemnão tem a sorte de entrar nesse Círculo fica na mercê do Es - tado. Há por isso uma incidência tendencial no objeto da Arte, orientada de acordo com as agendas políticas partidárias e paradigmáti- cas. “Quem ganha são sempre os mesmos.” No que me concerne, é certo que gostaria - enquanto criador - de poder partilhar de uma autossuficiência através da Arte. No entanto, a forma como organizo aminha vida vai no sentido de uma independência que vá além da Arte, não faço questão de viver dela, e muito menos de me associar a temáticas ou círculos para o poder fa- zer – todo o grande peixe de aquário é umpeque - no peixe no oceano. O facto de me estar a espe - cializar em Ensino das Artes Visuais permite-me manter uma certa linearidade e autonomizar-me desse risco, ou seja, colmatar a necessidade eco- nómica semcomprometer omeu sentido de cria - ção artística. Posso juntar tudo aquilo que estudei e dediquei toda a minha vida num duplo sentido: desenvolver aminha Obra livremente, procuran- do despertar perguntas; direcionar os conheci - mentos e experiências adquiridas no campo das Artes Visuais para uma vertente mais social – que não está presente no meu corpo de trabalho artístico – atribuindo valor à sociedade através do ensino, do contacto directo com as pessoas, da partilha do saber. Neste sentido, não entendo a minha Obra enquanto uma mercadoria, vejo-a como um excedente da minha vida; não é algo que faço por sobrevivência, mas algo que extra - pola a vivência, materializando-se em objetos estáticos – esculturas, pinturas ou escrita. Sarah Affonso (Artista e mulher de Al - meidaNegreiros) já denunciava, no século pas- sado, a falta de apoios enquanto um problema recorrente, mas que Almada insistia em ofere - cer várias obras.
A nível de apoios económicos, os Artis - tas têm quase nenhum. Até hoje, a maioria dos apoios que eu recebi foram de pessoas que me são próximas, que me convidam para expor o meu trabalho, que partilham concursos de arte, que me ajudam a aceder a materiais específicos que não estão aomeu dispor, que criticam cons - trutivamente omeu trabalho e as minhas ideias, e ainda aqueles que compram autocolantes, dos quais apenas obtenho quantias modestas. Mas não estará aí o valor da Arte? Não tanto o valor que o Artista atribui à própria criação (que não terá valor) mas o valor que outros atribuem? Sim, eu estou profundamente agradecido a quem me apoia, mesmo que seja com peque - nos gestos ou quantias. São pequenas coisas que se traduzem em grandes mudanças, mesmo na relação que temos com o público e que o públi - co tem com a nossa Arte. Já me aconteceu, por exemplo, colaborar com Associações, e a ten - dência é haver uma desvalorização do Artista. Desvalorização como? Arranjam esquemas como “pago-te as tintas e umas cervejas”. Fazerem entrevistas e não atribuírem os créditos aos autores. Dedicar várias horas a projetar ideias para algo especí- fico e desfazerem o negócio no último momen - to. Destruírem murais que pintei gratuitamen - te apenas alguns dias após os ter concebido. Há uma brutalidade, que notei desde cedo, no mundo da arte. Mas como pode decorrer essa atribui- ção de valor, por parte do Criador, a algo sem valor sem que se caía na contraproducência? É de facto uma linha subtil pela qual se caminha, tem de haver bom senso… criei um pack de autocolantes que estou a vender, apesar do preço de custo ser menor que o preço de ven -
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