Quadrante 15

Há uma expressão da espiritualidade Inaciana que é a indiferença. Que não se trata da indiferença de encolher os ombros perante as problemáticas próprias ou do mundo, visto que se trata de algo escrito no final da idade média, e as palavras têm outros significados. O significado da indiferença inaciana é: ter saúde ou doença, ter riqueza ou pobreza, fazer isto ou aquilo, é indiferente. É indiferente para aquele que sente a liberdade interior. Há uma libertação interior, a pessoa sente-se livre, profundamente livre. Livre para seguir um caminho ou para seguir outro; sente-se livre para tudo. Dentro das coisas muitíssimo boas que tem para escolher, escolhe aquela que lhe parece melhor. Há uma sensação grande de chegar ao cerne da liberdade interior, porque não é melhor ser padre do que ser casado, ser padre do que ser outra cousa melhor. Não és heróico, mais Santo, de maior proximidade, não é nada disso. Por isso mesmo é que é interessante chegar-se a um lugar… e com vinte anos sentimos sempre as coisas que podemos sentir em cada fase, tenho perfeita noção que haviam coisas à mistura que foram sendo purificadas, e que a decisão é tomada faseadamente, sendo que a decisão de seguir é do dia a dia. Seria absolutamente artificial dizer que havia uma decisão de uma vez para sempre. Existe um confirmar e reconfortar diário, e um reajuste gigante daquilo que é a ideia de vocação. E o que é a liberdade interior? Isto porque hoje parece existir uma confusão entre liberdade de voluntas, de vontade, de querer, e a liberdade de arbitrium, de arbitrar, de escolher. Chegar à liberdade interior não é chegar àquilo que nos apetece e àquilo que temos vontade de fazer, mas é antes chegar ao que temos verdadeiro desejo de fazer. Depois de retirados todos os obstáculos, todas as tralhas que nos

O que é que se manifesta no interior de um jovem de vinte que sente esse chamamento? Como é que discerne essa vocação? As relações familiares e de amizade transformam-se? A relação com as prospecções de vida também se alteram? É, sobretudo, um momento de afirmação, de autonomia. É uma decisão absolutamente pessoal, na qual não pode haver nenhum tipo de intromissão. Neste sentido, afecta todos os campos das relações. É, sobretudo, integral. Passa-se a viver em outro lugar, a habitar outras problemáticas. Percebes que estás num caminho de aventura, de odisseia com o próprio Deus. Em que não percebes nada do futuro. Há uma noção de baixar os braços, de te deixares levar na corrente, uma espécie de chamamento que pode parecer estranho, porque não se ouve uma voz exterior, mas uma voz interior que nos diz que é para ir por ali. Eu conheço os Jesuítas aos dezoito anos, já com uma conversão feita que não tem nada que ver com os Jesuítas. Eu tenho uma conversão em que sou apanhado pelo Espírito, que faz com que me passe a interessar, mais do que tudo, acerca disto. Essa experiência faz com que me comece a juntar a grupos, a participar em actividades, e que eventualmente faz-me encontrar esse grupo que ia a Rabo de Peixe. Só aos vinte, vinte e um anos é que decido ser Jesuíta. Não foram os Jesuítas, nem a Ordem que me levaram até Deus, foi… não foi ninguém, aconteceu. E nesses passos decide entrar na Companhia…

Foi Deus? - Foi Deus.

E ao tomar essa decisão, quais as primeiras Graças, as primeiras cousas boas que encontra? E quais as primeiras adversidades com que se depara?

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Quadrante, 2023

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