Quadrante 14
Direito Penal em Minoriy Report (2002)
O filme Minority Report de Steven Spiel- berg levanta várias questões filosóficas com especial impacto na filosofia do direito, mais concretamente na área do Direito Penal. Para quem não viu o filme, o mesmo situa-se no ano de 2054, em que existe um sistema de pre - visão precisa de crimes (sistema dos Precogs). Assim, antes de os mesmos serem cometidos, prendem-se aqueles que os iriam cometer. A narrativa desenrola-se quando o próprio de - tective John Anderton é previsto a cometer um assassínio. Não sendo, para os efeitos deste ar - tigo, necessário contar o resto da história, deixo para os leitores o desafio de irem ver o filme. A primeira grande questão que se põe é já alvo de debate há muito tempo: o determinismo versus o livre-arbítrio. De uma forma muito simplis- ta, a questão pode ser posta nestes termos: é o ser humano verdadeiramente livre nas suas es- colhas ou está ele determinado? O desenvolvi- mento das neurociências apresentam-se como um potencial contributo para este debate (atra- vés da exploração do conceito de consciência e a influência que o mesmo pode ter em diversas questões, nomeadamente na nossa concepção de legítima defesa). breve contextualização da questão. O determinismo radical defende que o universo é uma cadeia causal – uma sucessão necessária de causas e efeitos. Deste modo, todos os acon- tecimentos estão determinados por causas an - 1. O determinismo e o livre-arbítrio:
teriores e pelas leis da natureza. Os determinis- tas negam o livre-arbítrio. Para eles, este não passa de uma ilusão: pensamos que somos livres porque somos conscientes das nossas escolhas. No entanto, apesar dessa consciência, ignora- mos as causas que nos levam a agir. As nossas acções são inevitáveis, pois dependem de fac - tores que não controlamos enquanto agentes, o que torna as acções não livres. As acções são o resultado necessário de acontecimentos ante- riores. Fazemos o que o nosso passado determi - na que façamos e não aquilo que queremos. Elas não dependem de nós, mas de factores externos a nós e incontroláveis, pelo que não somos li - vres. As escolhas e acções não passam, assim, de meros acontecimentos. Esta é uma tese incom- patibilista pois aceita somente o determinismo, e recusa totalmente o livre-arbítrio. Esta tese é alvo de várias críticas. Em primeiro lugar, se o determinismo radical é verdade, então não há responsabilidade moral e as noções que temos de culpa e de mérito se - rão destituídas de sentido. Isto tem um eleva - díssimo impacto no direito, tendo em conta que a ordem jurídica funciona com base na culpa e na responsabilização da mesma. Em segundo lugar, não é plausível que todas as pessoas in - corram num erro sistemático e insanável, con- sistindo em pensar que são livres quando na verdade estão determinadas em como agem. Como Fiódor Dostoiévski escreveu no seu livro Crime e Castigo , “Todos somos responsáveis de
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Quadrante,2021
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