Quadrante 14

entre o cérebro e a mente. A relação entre am - bos muito nos diz sobre se estamos de facto de- terminados por factores bioquímicos ou não. O internalismo é a posição que defende que os estados mentais estão totalmente determina - dos pela actividade neuronal. Autores como a Patricia Churchland, e Greene e Cohen já men - cionados, defendem esta relação unidireccional (do cérebro para a mente), sendo a sensação de liberdade meramente uma ilusão. Todavia, há quemconsidere que não é por o cérebro e a mente terem a mesma substância que a mente é causalmente determinada pelo cérebro. Para quem defende o externalismo, há mais mente para além da actividade neuronal, e existe uma relação bidireccional. A nova descoberta dos neurónios-espe - lho vem corroborar esta teoria. Os neurórnios - -espelho fazem parte do cérebro social, e fazem com que o ser humano consiga compreender as emoções e intenções das outras pessoas, fazen - do uma simulação inconsiente dos seus estados mentais. Vemos, assim, que a mente não é re - duzível à mecânica biológica do cérebro, a pro - cessos que ocorrem dentro da cabeça. Como diz Andy Clarck, a mente é a “interface produtiva do cérebro, corpo e mundo social e material”. O agente cognitivo é a conjugação de um or - ganismo biológico e de recursos externos (Da - vid Chalmers). A actividade da mente depende muito da experiência e filiação cultural da pes - soa – a experiência cultural influencia a percep - ção e interpretação da realidade. O princípio do processo neuronal é de facto a experiência cul - tural, o que poderia indicar que o agente não é verdadeiramente livre (está condicionado pre- cisamente por essa cultura). Mas, segundo os externalistas, as valorações culturais são pro - duto da interação livre dos indivíduos. Pelo que a liberdade está presente no processo neuronal.

mesmo que seja certo que a pessoa vai matar alguém, tal sistema se justificaria? Será que o princípio da segurança deve prevalecer sobre a liberdade? É que o sistema, no fundo, não deixa os indivíduos exercerem a sua liberdade, for - çando-os a não exercê-la, pois nunca chegam a fazer a escolha nem a de facto agir. Em primeiro lugar, é de notar que saber o que vai acontecer, o que o agente vai fazer é dife - rente de tirar a liberdade para que o faça. Ou seja, nãoéporosistemasaberqueumapessoavaimatar outra que essa pessoa está determinada amatá-la. Dá-se aqui a mesma resposta ao velho dilema de saber como é que Deus sabe o que nós vamos fa - zer, pois sabe tudo, e mesmo assim somos livres: é como se Deus conseguisse ler o fim do livro que somos nós que estamos a escrever antes de o aca - barmos. Precisamente porque para Deus não exis - te tempo, tal como acontece, de uma certa forma, comos Precogs, visto que conseguemviajar nele. Posto isto, podemos entender então que pode-se considerar que o indivíduo é livre. Des - te modo, fica a questão: é justo, em nome da segurança, não permitir que os cidadãos exer - çam a liberdade? Note-se: uma coisa é impedir que o crime aconteça, algo legítimo que se tenta fazer nos dias hoje. Outra coisa é não permitir que a pessoa tenha sequer a tomada de deci - são. As pessoas não chegam sequer à situação em que têm de fazer uma escolha. Por mais que seja o futuro, este não chega a acontecer. E aqui põe-se um dilema fundamental: nada pode ser futuro se não vier a acontecer, pelo que, como já vimos, prendem-se pessoas por crimes que não cometeram e nem tiveram a oportunidade de cometer. Ou seja, o prender a pessoa faz com que a razão pela qual se prende a mesma dei - xe de existir. Mas o não prender leva ao crime. A uma certa altura no filme o Precrime é justifica - do comuma breve expressão: “It works”. Então, qual deve prevalecer: a segurança e eficiência ou a liberdade e a justiça? Parece-me que a justiça e liberdade devem prevalecer sobre a eficiência,

5. Qual o princípio prevalecente? Este filme levanta uma outra questão: será que,

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Quadrante,2021

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